o impacto do vício em jogos

Nos últimos anos, as plataformas de apostas online e bets se popularizaram no país, com forte presença em patrocínios esportivos e publicidade, alcançando milhões de brasileiros – especialmente os mais vulneráveis, como beneficiários de programas sociais. A promessa de dinheiro rápido contrasta com a realidade econômica dessas famílias e gera um fenômeno preocupante do ponto de vista social e psicológico.
As apostas online não criam riqueza social: apenas deslocam renda. De acordo com a Confederação Nacional do Comércio, em 2024, o varejo deixou de faturar R$ 103 bilhões, enquanto cerca de R$ 240 bilhões foram destinados às plataformas de apostas. Entre os mais afetados estão beneficiários de programas sociais – em agosto de 2024, R$ 3 bilhões foram transferidos via Pix dessas famílias para sites de apostas. Quase 17% dos cadastrados no Bolsa Família jogaram, gastando em média R$ 100, valor que deveria cobrir necessidades básicas.
O resultado é aumento da inadimplência, orçamentos comprometidos e a ilusão de que apostar é “investir”. Entre famílias que ganham de 3 a 5 salários mínimos, a taxa de contas em atraso subiu de 26% para 29%, em parte pelo endividamento com jogos.
Legalizadas em 2018, as apostas de quota fixa cresceram sem uma regulação clara, abrindo espaço para plataformas irregulares, evasão de divisas e lavagem de dinheiro. A inclusão de jogos de cassino, como o “Tigrinho” e o “Aviãozinho”, ampliou ainda mais o problema. O novo marco regulatório (Lei 14.790/2023), válido a partir de 2025, impõe CPF e reconhecimento facial obrigatórios, proíbe bônus de entrada e crédito, exige domínio “.bet.br” e centraliza o monitoramento das transações. Apesar dos avanços, faltam medidas de proteção aos mais vulneráveis e restrições à publicidade.
O vício segue um ciclo conhecido: vitória, perda e desespero – fase em que o jogador perde o controle, se endivida e pode chegar à depressão ou ao suicídio. O acesso facilitado pelo celular e os algoritmos que estimulam o jogo reforçam os riscos e transformam as apostas em um problema de saúde pública.
Embora o setor prometa arrecadação e empregos, cresce a preocupação com o impacto social. O Brasil vive uma transição da lógica de proteção social para uma cultura de risco e especulação. Sem políticas de prevenção, campanhas educativas e redes de apoio, a legalização das apostas pode se tornar mais um mecanismo de exclusão disfarçado de oportunidade.
Carlos Henrique é CEO da Sttart Pay. É formado em Direito e Administração, mestre em Planejamento e Controle Societário, mestre em Direito Penal e certificado ABT2.
Matéria: Gazeta do Povo





