RS abre caminho para nova política de prevenção a enchentes

As enchentes históricas que atingiram o Brasil nos últimos anos – da Bahia a Santa Catarina, passando por Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo e, tragicamente, o Rio Grande do Sul – escancararam os efeitos das mudanças climáticas e o preço altíssimo por décadas de omissão na gestão hídrica. Entre 2013 e 2023, o país destinou R$ 639,4 bilhões às ações de resposta a desastres naturais como enchentes, conforme a Confederação Nacional de Municípios. Uma conta que só cresce a cada nova calamidade, porque insistimos em atacar as consequências, e não as causas.
Depois das tragédias das enchentes vividas em 2023 e 2024, o Rio Grande do Sul decidiu romper esse ciclo. Em novembro, aprovamos por unanimidade na Assembleia Legislativa – e transformamos em ação governamental permanente – a Política Estadual de Apoio e Fomento ao Desassoreamento de Corpos Hídricos, um projeto de minha autoria construído ao longo de 18 meses de amplo debate. Trata-se da primeira política pública estadual do Brasil inteiramente dedicada ao desassoreamento, com regras claras, planejamento contínuo e integração entre Estado, municípios e iniciativa privada, prevendo ações de prevenção, dragagem e manejo de sedimentos.
Com a nova política estadual, o Rio Grande do Sul dá um passo histórico e oferece ao Brasil um caminho em que se substitui o improviso crônico pelo planejamento
A dimensão dessa mudança é estrutural. Por muito tempo, o Rio Grande do Sul negligenciou rios, arroios e canais, e a tragédia das enchentes que vivemos em 2024 tem completa relação com essa falta de cuidado. A nova política contempla rios, arroios, açudes, lagos, lagoas, lagunas, canais e barragens. Daqui para frente, os projetos de desassoreamento poderão ter prioridade no licenciamento, de forma que o órgão ambiental competente terá de adotar medidas para agilizar e simplificar os processos necessários. Com as dragagens, também se abre a oportunidade de retomar o uso de hidrovias para transporte de cargas e pessoas.
A legislação gaúcha teve o cuidado de dedicar um olhar atento ao meio ambiente. O texto aprovado prevê, por exemplo, a recomposição da mata ciliar e a realização de campanhas de educação ambiental. A política estabelece ainda a possibilidade de parcerias com a iniciativa privada e formas de aproveitamento econômico do material removido. Respeitando a natureza, teremos condições de remunerar o desassoreamento com o uso dos sedimentos orgânicos e inorgânicos, o que certamente tornará a atividade mais atrativa e viável economicamente.
Um estudo divulgado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), pelo Banco Mundial e pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) indica que apenas os prejuízos com a enchente de 2024 no Rio Grande do Sul somaram aproximadamente R$ 90 bilhões. Essa cifra representa mais do que a totalidade das despesas previstas no orçamento do estado durante um ano inteiro.
Dragar custa muito menos do que reconstruir cidades inteiras destruídas pela força das enchentes. Municípios que realizaram desassoreamentos recentes já relatam melhora na segurança, evidenciando que a prevenção funciona – e, principalmente, salva vidas.
Com a nova política estadual, o Rio Grande do Sul dá um passo histórico e oferece ao Brasil um caminho em que se substitui o improviso crônico pelo planejamento. Cada estado tem as suas particularidades climáticas e geográficas, mas nenhum pode prescindir de uma política pública contínua e técnica para manejo de sedimentos e respeito aos corpos hídricos. O RS está mostrando que é possível tratar o desassoreamento como política de Estado. Precisamos agora que o governo estadual inicie as ações previstas em lei o quanto antes. Desta forma, estaremos mais preparados e evitaremos que a destruição seja tão catastrófica cada vez que ocorrem eventos extremos.
Guilherme Pasin é deputado estadual (PP-RS)
Matéria: Gazeta do Povo





